13 de Agosto, 2022 Artigos

Grid-Zero - Como funciona - suas aplicações e homologação na distribuidora de energia elétrica

Qualquer pessoa que trabalha com sistemas fotovoltaicos já ouviu ou ainda vai ouvir falar de termos como zero export, grid-zero ou zero grid. Se fosse feita uma votação sobre qual seria a maior dúvida relacionada ao tema zero grid, a resposta seria a seguinte: é necessário homologar um “sistema” zero grid na distribuidora? A resposta é um grande SIM!

Neste artigo veremos o que é e como funciona um “sistema” zero grid, começando com a explicação do porquê estou colocando a palavra “sistema” entre aspas. Veremos também as possíveis aplicações do zero grid e, por fim, explicar porque devemos homologar o sistema fotovoltaico mesmo usando o zero grid.

Sistema Zero Grid? Não!

Um sistema de energia solar fotovoltaica, também chamado de sistema de energia fotovoltaica ou simplesmente sistema fotovoltaico, é um sistema capaz de gerar energia elétrica através da radiação solar. Existem três tipos principais de sistemas fotovoltaicos: sistema fotovoltaico conectado à rede (on-grid), sistema fotovoltaico autônomo (off-grid) e sistema fotovoltaico com armazenamento de energia [1]. O sistema fotovoltaico com armazenamento de energia pode ser capaz de operar conectado ou desconectado da rede elétrica.

Muitas pessoas podem dizer que o terceiro tipo de sistema é o sistema híbrido, mas o conceito de sistema fotovoltaico híbrido é um sistema que trabalha com uma ou mais fontes de energia. Por exemplo, quando o sistema fotovoltaico opera de forma integrada com geradores à diesel, turbinas eólicas, biomassa, dentre outros. No caso de um sistema fotovoltaico com baterias de reserva, a energia elétrica armazenada na bateria pode ser proveniente da fonte fotovoltaica ou de outras fontes.

Então onde entra o tal do “sistema” zero grid nessa classificação? Por esta classificação apresentada o grid zero não é um tipo de sistema. Veremos mais à frente que o zero grid é uma estratégia de controle de exportação de energia para a rede elétrica. Então as aspas na palavra “sistema” vem do fato de que não existe um “sistema” zero grid. O zero grid pode ser aplicado tanto em sistemas on-grid quanto em sistemas com armazenamento de energia. Para deixar mais claro este entendimento é preciso primeiro explicar detalhadamente o que é e como funciona o zero grid.

O que é e como funciona o Zero Grid?

Como já foi dito, o zero grid é uma estratégia de controle de exportação de energia para a rede elétrica. Ao contrário do que muitas pessoas pensam, um sistema fotovoltaico com o zero grid implementado está sim conectado à rede elétrica.

Trata-se de uma questão conceitual. Para controlar a quantidade de energia que um sistema fotovoltaico pode exportar para a rede elétrica, obviamente é necessário considerar que este sistema está conectado à rede elétrica. Então não faz sentido falar de controle de exportação de energia elétrica para a rede quando temos um sistema fotovoltaico autônomo (desconectado da rede ou off-grid). O mesmo se aplica à sistemas fotovoltaicos com armazenamento de energia quando estão operando no modo autônomo. Portanto, todo sistema que possui o controle zero grid está conectado à rede elétrica.

Observe o exemplo de gráfico de balanço energético de uma unidade consumidora com um sistema FV conectado à rede instalado, a seguir:


Figura 1 – Exemplo de gráfico de balanço energético de uma unidade consumidora.

No decorrer das 24 horas de um único dia temos a geração de energia do sistema fotovoltaico, que é a área sob a curva tracejada. A área em verde escuro é o autoconsumo, ou seja, a energia que é gerada pelo sistema FV e que é consumida instantaneamente pelas cargas da unidade consumidora. A curva cinza também é a energia consumida instantaneamente pelas cargas da unidade consumidora, porém, como esse consumo se dá em um horário em que o sistema FV não está gerando energia, essa energia consumida é proveniente da rede elétrica. Por fim, quando o sistema FV está gerando uma quantidade de energia maior do que o consumo da unidade consumidora, temos uma energia excedente. Caso essa energia excedente não seja armazenada, por exemplo, em uma bateria, ela será injetada na rede elétrica da distribuidora de energia e consumida por outras unidades consumidoras.

Por vários motivos pode ser necessário controlar a quantidade de energia elétrica que é injetada na rede da distribuidora. Existem situações onde é necessário controlar a potência injetada na rede elétrica até um determinado limite, ou simplesmente limitar a zero a potência injetada na rede. Veremos alguns exemplos mais adiante.

Primeiro precisamos entender como funciona o controle zero grid, para isso devemos considerar as seguintes premissas:

  1. O inversor FV é um inversor on-grid ou um inversor com bateria de backup operando no modo on-grid;
  2. O inversor FV deve ser capaz de controlar a quantidade de energia que ele deve gerar;
  3. O inversor FV deve receber a informação de quanta energia está sendo consumida naquele exato momento. Essa informação será usada para ajustar a quantidade de energia que deve ser gerada naquele momento.

A Figura 2 apresenta um sistema fotovoltaico conectado à rede elétrica com implementação de estratégia de controle de exportação de energia elétrica para a rede elétrica. Se o objetivo da estratégia de controle é não injetar energia na rede, ou seja, injeção zero, é mandatório que o inversor fotovoltaico gere apenas a quantidade de energia que está sendo consumida no momento.

Por exemplo, considere que em um determinado momento uma unidade consumidora está consumindo 80 kW e o sistema fotovoltaico está gerando 100 kW. Nesse caso, sem um controle de exportação, teríamos um autoconsumo de 80 kW e a injeção de 20 kW na rede elétrica. Por outro lado, com um controle de exportação configurado para não injetar energia na rede, teríamos um medidor de energia inteligente enviando a informação para o inversor de que as cargas da unidade consumidora estão consumindo 80 kW e o inversor, por sua vez, ajustaria sua potência para gerar apenas 80 kW. Desta forma, nenhuma quantidade de energia excedente seria injetada na rede elétrica.

 

Figura 2 – Sistema FV conectado à rede com controle de exportação de energia.

Agora fica mais claro de perceber que para que esta estratégia funcione é necessária a informação de quanta energia está sendo consumida naquele exato momento. Essa função é exercida por um medidor de energia inteligente, que é capaz de enviar a informação de energia consumida ou injetada para outros equipamentos. No caso, o equipamento que recebe essa informação é o inversor fotovoltaico. O inversor deve ser capaz de interpretar a informação enviada pelo medidor, ou seja, os protocolos de comunicação de ambos devem ser compatíveis. E finalmente, o inversor deve ser capaz de ajustar sua potência de forma interativa e na velocidade adequada. Esse ajuste de potência é obtido através de uma simples configuração do inversor para que ele funcione no modo de controle de exportação.

Essa estratégia de controle não é nenhuma inovação ou novidade no mercado fotovoltaico. Existem países inteiros ou distribuidoras de energia elétrica em alguns países que não permitem injetar energia elétrica na rede de distribuição, por exemplo, Austrália, Índia, Marrocos, dentre outros. Da mesma forma, também existem países ou distribuidoras que limitam a quantidade de energia elétrica que pode ser injetada na rede elétrica pelas unidades consumidoras. Uma das soluções adotada pelos consumidores destes países ou distribuidoras foi implementar o controle de exportação em seus sistemas FV. Outras soluções incluem a otimização do autoconsumo, acionamento de cargas em momentos de maior geração ou armazenamento do excedente de energia em baterias.

Aplicações

O termo zero grid dá a entender que a limitação de energia injetada na rede é zero, mas se pensarmos do ponto de vista de limitação de exportação, que é o conceito mais amplo dessa estratégia de controle, podemos aplicar esse controle em situações onde existem restrições para a quantidade de energia injetada na rede. Por exemplo, pode existir a restrição de potência nominal de um transformador à jusante do sistema fotovoltaico.

Um outro exemplo, é a limitação de injeção de energia em locais onde não é possível ou não é permitida a injeção de energia elétrica na rede. Por exemplo, na Esplanada dos Ministérios em Brasília, salvas algumas exceções, o fornecimento de energia elétrica é subterrâneo onde é adotada a topologia de rede reticulada. Os sistemas de distribuição subterrâneo reticulado proporcionam uma maior confiabilidade no fornecimento de energia elétrica e apresentam baixas taxas de interrupção devido à possibilidade de se manter o suprimento de potência durante contingências nos alimentadores primários [2]. Ocorre que os sistemas de proteção das redes reticuladas interpretam a injeção de energia elétrica como um defeito na rede. Um defeito pode comprometer o restabelecimento da rede, proporcionando um tempo de até 12 horas para o restabelecimento da rede e afetando o abastecimento de uma região extremamente sensível como o centro de São Paulo [2]. Apesar disso, a rede reticulada apresenta uma alta confiabilidade operacional, com índices DEC e FEC muito próximos de zero.

Um exemplo de sistema fotovoltaico instalado em uma unidade consumidora atendida por uma rede reticulada é o Ministério da Defesa, em Brasília (Fig. 3).

 

Figura 3 – Sistema FV conectado à rede instalado no prédio do Ministério da Defesa com rede reticulada e implementação do zero grid. Fonte: Renova Engenharia.

Outro exemplo de aplicação do zero export é em consumidores livres ou especiais, visto que a adesão ao sistema de compensação de energia elétrica não se aplica a esses tipos de consumidores [3, 4]. Esses tipos de consumidores não receberão nenhum benefício ao injetar energia na rede elétrica da distribuidora. Isso não impede o consumidor livre de instalar um sistema fotovoltaico.

Por fim, outro exemplo de aplicação do controle de injeção de energia na rede elétrica é a otimização do autoconsumo. Quanto mais otimizado for o autoconsumo, menor será a conta de energia e menores serão as cobranças de taxas, como: iluminação pública e bandeiras tarifárias por exemplo.

Homologação

Os sistemas fotovoltaicos com implementação do zero grid não estão livres de homologação junto às distribuidoras de energia elétrica, visto que estes sistemas precisam da referência da rede elétrica para operar em sincronismo com a rede elétrica e ainda precisam obedecer à necessidade da função de anti-ilhamento. Inclusive, existe a previsão normativa da distribuidora de energia elétrica suspender o fornecimento de energia nos casos de instalação de geração à revelia, caso o paralelismo permanente da rede com o gerador do consumidor resulte em problemas técnicos e de segurança para a rede, assim como para outros consumidores.

A necessidade de homologação não se aplica somente aos sistemas fotovoltaicos conectados à rede com ou sem armazenamento de energia. Qualquer central geradora de um consumidor que opere em paralelo com a rede de distribuição deve ter o seu projeto submetido e aceito pela distribuidora. Os procedimentos, requisitos e orientações para conexão de central geradora de energia ao sistema elétrico podem ser encontrados nas documentações específicas de cada distribuidora.

Para aqueles que ainda possam ter dúvidas ou ainda afirmam que um sistema fotovoltaico operando em zero grid não opera em paralelo com a rede da distribuidora, basta realizar um teste prático bem simples: desligue o disjuntor do padrão de entrada. Se o inversor fotovoltaico desligar é porque ele estava funcionando em paralelo com a rede da distribuidora e simplesmente atuou a sua função de anti-ilhamento.

Na dúvida, a recomendação é: sempre consulte a distribuidora que fornece a energia elétrica para a unidade consumidora e peça uma resposta clara e objetiva baseada em suas normas técnicas, regulações, requisitos, etc. Nunca confie cegamente em informações passadas em redes sociais ou vendedores de sistemas fotovoltaicos.

Potência Instalada da Unidade Geradora

Muitos devem agora estar se perguntando como regularizar seu sistema FV que está instalado e não foi devidamente homologado na distribuidora de energia.

Segundo a Resolução Normativa Nº 676, a potência instalada da unidade geradora é a potência nominal elétrica, em kW, na saída do inversor, respeitadas limitações de potência decorrentes dos módulos, do controle de potência do inversor ou de outras restrições técnicas [5]. Percebe-se que existe o reconhecimento e a previsão regulatória do controle de potência do inversor por parte da ANEEL desde 2015. Portanto, o controle de potência do inversor deve ser levado em consideração ao declarar a potência instalada da unidade geradora.

Além disso, na recente Resolução Normativa Nº 1000, em sua seção de direitos e deveres, está explicito que o consumidor e demais usuários devem consultar previamente a distribuidora sobre o aumento da carga ou da geração instalada que exigir a elevação da potência injetada ou da potência demandada [6].

Desta forma, é possível comprovar para a distribuidora de energia elétrica que o conceito de potência instalada da unidade geradora é diferente do conceito de potência de nominal do inversor fotovoltaico se existir o controle de potência do inversor e que a efetiva potência instalada não elevará a potência injetada da geração instalada. Inclusive, já existem casos de sistemas fotovoltaicos instalados com o zero grid devidamente homologados nestas condições.

Quais equipamentos executam a limitação de exportação?

Existem diversas opções no mercado brasileiro de inversores fotovoltaicos capazes de controlar sua potência de saída e que, complementado com um medidor inteligente, é capaz de executar a função de limitação de exportação. Por exemplo, os microinversores APsystems são capazes de executar a função de limitação de exportação. Essa função pode ser aplicada em redes monofásicas e trifásicas com o uso da ECU-C e transformadores de corrente (TC’s). 


Figura 4 – Exemplo de ligação física da ECU-C para executar a função medidor inteligente. Fonte: APsystems.

 Quando a função medidor da ECU-C estiver ligada, os usuários poderão visualizar a produção de energia, consumo de energia ou energia utilizada na página “Meter”.

 

Figura 5 – Exemplo de configuração de limitação de potência na ECU-C. Fonte: APsystems.

A função de controle de energia redundante pode fazer com que um equipamento elétrico utilize a energia excedente. Se a energia produzida for maior do que a limitação de potência, a ECU-C fechará um contato de relé para ligar um equipamento adicional e otimizar o autoconsumo.

Outros fabricantes distribuídos pela Ecori realizam a função de limitação e controle de exportação de energia para a rede elétrica, como SolarEdge e Huawei. Temos um vídeo no canal da Ecori no Youtube falando mais sobre este tema: https://www.youtube.com/watch?v=hgN9BLaUD6M

Conclusão

A limitação de exportação consiste em limitar a quantidade de energia elétrica produzida pelo sistema FV e injetada na rede. A exportação zero consiste em limitar completamente a injeção de qualquer quantidade de energia na rede elétrica. Esta estratégia de controle não é novidade, visto que ela é utilizada há vários anos em diversos países para determinadas aplicações específicas.

Existem várias aplicações para esta estratégia de controle de exportação de energia para a rede elétrica, como por exemplo, restrições da rede, solucionar restrições de consumidores livres ou especiais e otimizar o autoconsumo.

Os sistemas FV que implementam estratégias de controle de exportação de energia não estão livres de homologação junto às distribuidoras de energia elétrica, pois os mesmos operam em paralelo com a rede elétrica, seja um paralelismo momentâneo ou permanente.

A Ecori oferece e sempre ofereceu ao mercado opções de sistemas fotovoltaicos em que é possível aplicar o controle de exportação de energia para a rede. Atualmente contando com soluções APsystems, SolarEdge e Huawei para implementação da limitação de exportação.

Referências

[1]    Ibrahim, H. A., Abdelwahab, S. A. M., Eid, M. A. E., Elbaset, A. A., “Performance Analysis of Photovoltaic Systems with Energy Storage Systems”, Springer International Publishing, Alemanha, 2019.

[2]    Marcelo A. Pelegrini, João C. Guaraldo, Henrique Kagan, Carlos M. V. Tahan, Benedito V. Mello, “Sistema de Distribuição Subterrâneo Reticulado – Ferramenta de Análise e Otimização”, VI CITENEL, Fortaleza, 2011.

[3]    Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, Resolução Normativa Nº 482, de 17 de abril de 2012.

[4]    Lei Nº 14.300, “Institui o marco legal da microgeração e minigeração distribuída, o Sistema de Compensação de Energia Elétrica e o Programa de Energia Renovável Social, 2022.

[5]    ANEEL, Resolução Normativa Nº 676, de 25 de agosto de 2015.

[6]    ANEEL, Resolução Normativa Nº 1.000, de 07 de dezembro de 2021.

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