07 de Dezembro, 2021 Artigos

Parte 2 - Os Riscos do Arco Elétrico em Sistemas Fotovoltaicos e Soluções de Segurança - Parte 2

Continuação do Artigo anterior (...) 


2. Itália

Um estudo conduzido por pesquisadores da Tecsa SRL (empresa de consultoria especializada), da Politécnica de Torino e a Brigada Nacional de Combate ao Incêndio da Itália apresentou uma avaliação do risco de incêndio de instalações fotovoltaicas [23].

Merece destaque o abstract do artigo que constata o seguinte:

“As usinas fotovoltaicas conheceram um aumento acentuado no número e na potência instalada na última década em todo o mundo. Juntamente com este crescimento, também os riscos associados aumentaram significativamente. Dentre estes, o risco de incêndio chamou a atenção de ambas as Autoridades, gerentes de usinas e quaisquer outras partes interessadas (como os proprietários da propriedade) devido ao alto número de incêndios envolvendo usinas solares”.

A Figura 6 mostra a quantidade de incêndios relacionados a usinas fotovoltaicas na Itália no período de 2003 a 2014 (11 anos).



Figura 6 – Incêndios relacionados a usinas fotovoltaicas na Itália. Fonte: Italian National Fire Corp, Statistical Service [23].

 

Os dados disponíveis sobre incêndios em usinas fotovoltaicas incluem uma grande variedade de episódios de incêndio, incluindo incêndios em caixas de conexão, incêndios envolvendo apenas alguns módulos fotovoltaicos e grandes incêndios (a maioria) ocorridos em usinas localizadas no telhado do edifício, que se espalharam para dentro através das claraboias no telhado” [23].

O estudo apresenta algumas causas raízes para, em seguida, afirmar que um dos efeitos finais desses fenômenos está associado a um arco CC.

É interessante fazer um comparativo com o mercado brasileiro, o qual se iniciou efetivamente após a publicação da Resolução Normativa Nº482 de 17 de abril de 2012. Ao fazer um paralelo com do mercado brasileiro com o mercado italiano, onde em 2012 foram registrados quase 800 casos, é possível afirmar que se não forem adotadas ações regulatórias ou normativas no sentido de mitigar riscos de incêndios em edificações com sistemas fotovoltaicos, estaremos arriscando repetir o mesmo cenário de aumento exponencial de casos de incêndio relacionados a usinas fotovoltaicas.

No caso da Itália o número de casos de incêndios só começou a diminuir após a publicação e aplicação de duas diretrizes:  Fire Safety of Photovoltaic Systems, Province of Trento, 2011 e Guidelines for PV plant Installation, Dipartimento dei vigili del fuoco, Dipartimento del soccorso pubblico della difesa civile, 2012 Edition.

 

2.     3. Alemanha

Um amplo estudo sobre perigos de incêndios em sistemas FV [24], conduzido por pesquisadores do Instituto Fraunhofer para Sistemas de Energia Solar, TÜV Rheinland Energia e Meio Ambiente, Corpo de Bombeiros de Munique e Universidade de Berna para Ciencias Aplicadas, foi publicado e apresentado na EU PVSEC, que é a maior conferência internacional de pesquisa, tecnologias e aplicações fotovoltaicas. Os casos estudados fazem parte de uma base de dados que compreende o período de 1995 a 2012 (17 anos) e foram limitados ao território alemão. De um total de 400 incidentes, 180 casos (45%) foram provocados pelo sistema fotovoltaico.

Neste estudo, o qual é bem mais amplo e detalhado que o do Reino Unido e Itália, chama a atenção a quantidade de casos onde o inversor foi o responsável pelo início do incêndio, conforme pode ser visto na Figura 7 a seguir:

 


Figura 7 - Contagens de componentes onde o incêndio começou [24].

 

Reiteramos que os componentes por si só não geram um arco elétrico e, sim, os níveis de tensão CC aos quais estes componentes estão submetidos. Convém deixar registrado que, a partir da página 3 de [24] o estudo aponta diversas vezes o arco elétrico como o risco fundamental, conforme Figura 8 a seguir:

  


Figura 8 - Arco elétrico sendo apontado como risco fundamental em [24].

           

Por fim, o estudo afirma que “em aplicações críticas, o emprego de detectores de arco deve ser considerado para reduzir o risco de incêndio [24].

Entendemos como aplicações críticas justamente os locais onde não existem pessoas qualificadas e treinadas para lidar com os riscos do arco elétrico, por exemplo, instalações em residências.

 

3.     4. Brasil

O problema do arco elétrico vem tomando grandes proporções no Brasil. Já foram registrados vários casos de incêndios ocorridos por causa do arco elétrico. Seguem algumas imagens de algumas instalações no Brasil onde o arco elétrico provocou um incêndio:

 



Figura 9 – Incêndio provocado por arco elétrico no circuito de corrente contínua com inversor FV.

 


Figura 10 – Incêndio provocado por arco elétrico no circuito de corrente contínua com inversor FV.

 

Figura 11 – Incêndio provocado por arco elétrico no circuito de corrente contínua com inversor FV.

 

      

Figura 12 – Incêndio ocorrido por arco elétrico no circuito de corrente contínua com inversor FV.

 


Figura 13 – Incêndio ocorrido por arco elétrico no circuito de corrente contínua com inversor FV.

 


Figura 14 – Incêndio ocorrido por arco elétrico nos condutores de corrente contínua com inversor FV.


             

Figura 15 – Incêndio ocorrido por arco elétrico nos condutores de corrente contínua com inversor FV.

Alguns destes casos possuem vídeos da ocorrência, os quais foram obtidos através de grupos de discussão na web.

 

Discussão

Mais de 50% do market share de inversores vendidos no Brasil são de marcas que também comercializam em mercados que obrigam tanto o AFCI quanto o Rapid Shutdown, portanto, possuem domínio dessas tecnologias. Contudo, algumas dessas marcas optam por trazer versões mais simples e consequentemente menos seguras para o mercado Brasileiro, exatamente por não haver a obrigatoriedade desses dispositivos.

O consumidor final normalmente desconhece os riscos associados às instalações fotovoltaicas. Somado a isso, muitos instaladores no Brasil desconhecem os riscos por possuírem baixo nível de qualificação técnica. Por este motivo, é fundamental que os equipamentos fotovoltaicos possuam proteções internas que possam detectar eventuais falhas nas instalações que causam consequências gravíssimas, como perdas de vida por choque elétrico ou incêndio.

As normas ABNT NBR 5410 e 16690 estão em processo de revisão. Há também a expectativa de mudanças na NBR 5410 que estabelecerá, em um primeiro momento, a recomendação do uso de dispositivos de detecção e interrupção de arco elétrico (AFCI) nas instalações elétricas de baixa tensão. Consequentemente, o AFCI também deverá ser discutido na revisão da NBR 16690 nas instalações de sistemas fotovoltaicos.


Conclusão

O assunto “detecção e interrupção de arco elétrico” é de extrema importância por se tratar de uma solução para atender às necessidades de segurança do mercado FV, tendo atingido maturidade suficiente para sua aplicabilidade.

Os arcos elétricos são um problema grave que ocorre em sistemas fotovoltaicos. Podem ser encontradas tensões em telhados de 600 volts, 800 volts e podendo chegar até 1.500 volts em corrente contínua. Ao trabalhar com esses níveis de tensão, o risco de arco elétrico sempre existirá.

Portanto, vimos que o risco de arcos elétricos e, consequentemente, mortes, ferimentos, perdas e danos de patrimônios é uma preocupação séria. Existem países que adotam o AFCI como obrigatório e vimos pesquisadores de importantes instituições recomendando a aplicação de detectores de arco para reduzir o risco de incêndio.

É possível comprar inversores com o circuito AFCI integrado, como por exemplo, os inversores da Huawei que possuem o AFCI integrado em seus inversores de string. Outra opção é utilizar tecnologias como a dos microinversores APsystems que, por trabalharem com extra-baixa tensão, naturalmente dispensam o AFCI. Esta é mais uma das considerações que todo bom projetista de sistemas fotovoltaicos deve ser levar em conta na seleção do inversor e na tecnologia de sistemas fotovoltaicos.


Referências

[1]     M. K. Alam, F. Khan, J. Johnson, and J. Flicker, “A Comprehensive Review of Catastrophic Faults in PV Arrays: Types, Detection, and Mitigation Techniques”, IEEE J. Photovolt., vol. 5, no. 3, pp. 982–997, 2015.

[2]     Isermann, Rolf, “Fault-Diagnosis Systems: An Introduction from Fault Detection to Fault Tolerance”, Alemanha, Springer Berlin Heidelberg, 2006.

[3]     Prysmian Cables & Systems, “Manual Prysmian de Instalações Elétricas”, 2010.

[4]     Shiva Gorjian, Ashish Shukla, “Photovoltaic Solar Energy Conversion - Technologies, Applications and Environmental Impacts”, Academic Press, 2020.

[5]     John H. Wohlgemuth, “Photovoltaic Module Reliability”, Virginia, USA, Wiley, 2020.

[6]     Sean White, “Solar Photovoltaic Basics: a Study Guide for the NABCEP Associate Exam”, Second Edition, 2019.

[7]     Reinders, A., Verlinden, P., Van Sark, W., & Freundlich, A., “Photovoltaic Solar Energy: from Fundamentals to Applications”, John Wiley & Sons, 2017.

[8]     Ashok L. Kumar, S. Albert Alexander, Madhuvanthani Rajendran, “Power Electronic Converters for Solar Photovoltaic Systems”, Academic Press, 2020.

[9]     Associação Brasileira de Normas Técnicas, Norma Brasileira ABNT NBR 16690:2019 - Instalações Elétricas de Arranjos Fotovoltaicos - Requisitos de Projeto, 2019.

[10]   Regulation and Supervision Bureau for the water, wastewater and electricity sector in the Emirate of Abu Dhabi, “Installation of Solar PV Systems Guidance Document”, www.rsb.gov.ae., Publication No. EP/P04/101, January, 2017.

[11]   International Electrotechnical Commission, IEC 62109-2:2011 - Safety of Power Converters for Use in Photovoltaic Power Systems - Part 2: Particular Requirements for Inverters.

[12]   2014 National Electrical Code, ANSI/NFPA70, Published by the National Fire Protection Association, Quincy, MA, 2014.

[13]   2011 National Electrical Code, ANSI/NFPA70, Published by the National Fire Protection Association, Quincy, MA, 2011.

[14]   UL Standard for Photovoltaic (PV) DC Arc-Fault Circuit Protection; UL 1699B, Underwriters Laboratories, Edition 1, 2018.

[15]   International Electrotechnical Commission, IEC 63027 ED1 - DC Arc Detection and Interruption in Photovoltaic Power Systems.

[16]   Bill Brooks, Sean White, “Photovoltaic Systems and the National Electric Code”, Taylor & Francis, 2018.

[17]   Yongheng Yang, Katherine A. Kim, Frede Blaabjerg, Ariya Sangwongwanich, “Advances in Grid-Connected Photovoltaic Power Conversion Systems”, Woodhead Publications, 2019.

[18]   NBR 5410

[19]   Roger Messenger, Amir Abtahi, “Photovoltaic Systems Engineering”, Fourth Edition, CRC Press, 2017.

[20]   White Paper - History of the AFCI - Siemens Download Center.

[21]   Electrical Safety Foundation International, News Release, November 7, 2005.

[22]   BRE National Solar Centre, UK, “Fire and Solar PV Systems - Investigations and Evidence”, Report #P100874-1004, Issue 2.5, July, 2017.

[23]   Fiorentini L., Marmo L., Danzi E., Puccia V., 2016, “Fire risk assessment of photovoltaic plants. a case study moving from two large fires: from accident investigation and forensic engineering to fire risk assessment for reconstruction and permitting purposes”, Chemical Engineering Transactions, 48, 427-432.

[24]   H. Laukamp et al. “PV Fire Hazard – Analysis and Assessment of Fire Incidents”, 28th EU PVSEC 2013, Paris.

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